quinta-feira, 22 de agosto de 2013

Magellan VII - Parte V

Alta madrugada. Uma mulher entra em casa, descalça, despenteada e vestindo um jaleco branco coberto de manchas vermelhas. Vai direto para o chuveiro e, antes que termine o banho, a porta do banheiro se abre repentinamente.

Mas quem é você?

No dia seguinte, terríveis notícias se espalharam: um incêndio incompreensível matara uma família inteira durante a noite e dois cadáveres degolados foram encontrados no mesmo bairro. Desnecessário dizer o quanto esses acontecimentos abalaram o estado moral dos cidadãos, que ficaram chocados apenas pela possibilidade de tais barbáries serem executadas.

Kari, entretanto, tinha problemas mais urgentes para se preocupar. Ymir parecia ter envelhecido dez anos na semana posterior ao incidente e se tornava a cada dia mais distante do homem que ela conhecia, tanto que o casamento ficou esquecido em algum lugar do caminho.

Não tocou na comida de novo...? Desse jeito vai acabar doente... Kari se aproximou do namorado, que passava os dias olhando perdidamente pela janela do quarto, de pijamas e barba por fazer. Parecia que esqueceria até de respirar se ela não estivesse por perto.

Não tenho fome. desviou-se do toque dela, ranzinza.

Eu não sei mais o que fazer com você, sabia... ela desabafou, já cansada da situação Eu sei que foi difícil, mas você não precisa agir... assim.

Você não sabe nada. Você não viu. ele resmungou baixo, imóvel. A atmosfera estava pesada a ponto de Kari sentir-se enjoada. O desespero transpassou seu peito e ela deixou que transbordasse.

Eu sinto muito, Ymir. abraçou-o com força Sinto muito mesmo. Se eu pudesse... eu trocaria de lugar com você. Se eu pudesse entender o que está acontecendo...

VOCÊ NÃO PODE ENTENDER! ele a sacudiu pelos braços em um rompante violento SE ENTENDESSE, NÃO IA QUERER ESTAR NO MEU LUGAR!!!

Assustada pela reação inesperada, Kari desvencilhou-se com força e despejou no rosto dele o copo d'água que mantinha ao lado da cama, fazendo-o parar. Esfregando os braços ainda doloridos, ela se afastou dois passos para trás, incrédula, enquanto os dois se encaravam transtornados.

Eu não sei... colocando o rosto entre as mãos, Ymir desabou – eu não sei o que está acontecendo comigo...

Kari limpou as lágrimas que escorriam pelo rosto e, ainda tremendo, tentava colocar os pensamentos no lugar quando a campainha soou. Ao atender, Jano Bichel cumprimentou-a com uma expressão preocupada no rosto, rara no rosto do astronauta veterano.

Olá Kari. O Ymir está em casa também?

Ele está... descansando um pouco, mas o que aconteceu, Jano? Sua cara está péssima, e... você também foi liberado tão rápido de TerechKova?

Na verdade, eu precisava que vocês voltassem comigo até lá. É sobre o Loge, mas... não posso falar aqui.

Kari respirou fundo, pensando no melhor jeito de recusar, mas Ymir apareceu atrás dela em seguida sem se importar com seu aspecto doentio e pijama amassado, parecendo interessado.

Que tem o Loge...?

Antes que Jano pudesse continuar, uma algazarra começou a poucos metros dali. Dois grupos pareciam estar se enfrentando com qualquer coisa que pudessem usar como arma, inclusive os próprios punhos e dentes.

Mas o que é AQUILO? - Kari arregalou os olhos enquanto as palavras ouvidas na enfermaria voltavam a sua mente: História Antiga acontecendo ao vivo. Não que ela entendesse muito disso, mas ouvira falar que antigamente esses conflitos eram comuns entre as pessoas. Só não imaginaria presenciar isso em sua geração.

Por onde você andou esses dias? Começou há uma semana, desde os assassinatos e o incêndio. A cidade está a cada dia pior.

Andamos... ocupados. Ymir engoliu em seco, abraçando Kari pelo ombro – Mas conte tudo enquanto vamos para TerechKova.

Certo. Estou com a Unidade Móvel Especial, então será rápido.

Apesar do receio inicial, Kari olhou de viés para a confusão próxima e concluiu que seria melhor sair logo dali, mesmo que o destino fosse incerto.

Um comentário:

  1. Saudações

    Conflitos, violência...
    Depois de ter lido os capítulos anteriores, confesso que estou quase compreendendo na totalidade a ambientação e a história do mesmo, Ana...

    Mas prefiro ficar curioso, por agora, e assim aproveitar melhor o que aparecerá pela frente...

    Até mais!

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